terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

Amor de Mordaça: O Encanto (Fragmento XIX)



Volto para faculdade no dia seguinte, toda uma história de desilusões levam-me a estar exausto desta luta. Eu a amo como nunca amei ninguém, isso sem nem mesmo namorá-la. Sinto, porém, que não tenho mais forças nem argumentos para investidas, que minha gana e minhas palavras acabaram. 

Sempre fui um homem de poucas palavras apesar do meu tagarelismo constante, mas ela era tão calada que eu achava que se eu ficasse calado, teria menos chances ainda. Sem palavras, minhas chances estariam, irremediavelmente, acabadas. Por coincidência, lendo uns textos de La Rochefoucauld encontro a seguinte frase: “As paixões são os únicos oradores que sempre convencem.” Algo inspirador.

Todavia, cada vez mais o beijo no laguinho mostra-se como um acidente de percurso. Ela não quer mais viver um relacionamento, essa é a verdade. Tão verdade quanto o fato de que ela não gosta de homens e, mais importante ainda, que ela não me deseja, não gosta de mim. 

O desejo não é à priori, nem sobretudo, uma relação com o mundo (que só aparece aqui como palco para relações diretas com o outro). Geralmente é na presença do outro que o mundo se depara como mundo do desejo. O seu desejo, é isso que desejo e não vejo existir oriundo dela, neste palco chamado Recife que torna-se um inferno, Hellcife, como dizem, sem a sua pequena grande presença enquanto um ser que me beija, que me quer, que me ama.

Pelo Grande Deus dos Amantes, que aconteça alguma coisa que nos aproxime, algum milagre sem precedentes que faça com que nossas vidas se encontrem de alguma maneira. Sinto-me, agora, um homem do nada, numa terra de ninguém. Um ser que, sem ela, fica vazio. Eu a quero, eu a quero para sempre e sei que sempre vou querê-la para sempre. Que mal eu fiz para sofrer tanto? Que mal eu fiz para amar tanto?

Dias depois, vou ler uns emails e a encontro online, ela me conta que há pessoas que falam mal de mim para ela, mais precisamente que eu só andava bêbado pelos lugares e dando em cima das amigas dos outros. Ela me pergunta se deve acreditar. Eu, sarcasticamente, respondo que sim. “Quer um conselho? Acredite!”. Essa foi a frase que utilizei para encerrar o assunto. 

O fato é que eu sempre bebi muito, mas nunca fiquei bêbado de verdade. Alem disso, nunca fui uma pessoa de esconder o que penso, sempre falei na cara e olhando nos olhos. Isso é um defeito terrível no mundo falsário e superficial de hoje. A falácia, meu amigos, neste mundo é a lei. Bebendo, a veracidade de minhas palavras alcançava um tom insultante, como bebia demais, falava verdades demais. Insultava demais, sobretudo. Principalmente as pretensas feministas pseudo-moderninhas que não passavam de paradoxais tias velhas fantasiadas de Amelie Polain. Recife é uma Sodoma com ares reacionários.

Já em relação à acusação de eu dar em cima das amigas dos outros, nunca fui de dar em cima de ninguém. Nunca fui de ficar com uma pessoa sem passar um tempo conhecendo-a. Minha higiene é algo que eu preservava. Sou, em suma, um Menino Dionisíaco de Família.

O que percebo é que minha amada está diferente, está preocupada com a pessoa que sou, e, se está preocupada, obviamente existe uma grande possibilidade de estar interessada. Ligo para ela e pergunto o que  sente. Ela demonstra vontade de ficar comigo pela primeira vez desde que tínhamos nos conhecido, isso salva a minha noite. Talvez isso salve a minha vida.

No dia seguinte eu a encontro, vamos ao local do primeiro beijo, conversamos um pouco e ela me diz algo que eu nunca esperava ouvir, não direi agora a tal frase dita por ela por uma questão de suspense, ou seja, foi forte! Depois disso eu a beijo, ela novamente reclama do meu beijo, reclamação que duraria por mais ou menos um mês a partir dali. Ela poderia reclamar por mais um século e eu ainda assim eu estaria feliz. Eu estou feliz, na verdade, eu nunca estive tão feliz em minha vida. Ela está me beijando, ela está feliz em me beijar.

Chega o fim da noite, ela deixa claro que não quer que os seus pais nem seus amigos saibam o que está acontecendo. Eu aceito a sua decisão. Peço-lhe em namoro nesse mesmo dia. Ela dá um sorriso debochado e diz que, naquele momento, não quer namorar comigo. Faço-lhe um confronto com aquilo que ela havia dito dias antes, que não era menina de ficar, e sim, de namorar. Ela retruca dizendo que não estamos ficando, que estamos juntos, mas não estamos namorando. Não me importo, por enquanto, com a definição do que há entre nós... No amor, basta uma noite para fazer de um homem um deus! E eu, ali, diante de patos, gansos, casais sarrando e trepando, era um deus. Pelo menos estava tomado por um: Eros.

(continua...)

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