segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

Amor de Mordaça: O Encanto (Fragmento VII)

 
Ao sair de meu claustro, acontece algo que eu não esperava, percebo que ela estava preocupada comigo, com saudade, quiçá! Quer saber se eu estou vivo, por onde eu ando, o que aconteceu comigo. Sem dúvida, o tempo é o que se faz e o que faz com que tudo se faça.

Havia, entretanto, uma questão: ela possuía o número de meu telefone e, por algum motivo, não ligou para mim durante o tempo em que passo afastado.  O fato é que ela, novamente através da internet, entra em contato comigo. A questiono pelo fato dela não ter me ligado, ela diz que não sabia se era para ela ligar. Não sabia... E pronto.

Tenho a consciência de que tê-la será um sonho, será um êxtase. Porém me coloco de uma forma diferente diante do sofrimento causado por suas reações evasivas que, conseqüentemente, fazem-me sofrer. Para encontrar encantos no êxtase é imprescindível que o desejo seja incitado por estorvos, estado de êxtase contínuo significa o não-êxtase, aquele que nada tem a almejar é com certeza mais infeliz do que aquele que sofre. Eu sofro, mas para ser, adiante, feliz. E, sem dúvida, já está na hora de sê-lo!

Depois de algumas conversas consigo convencê-la a sair comigo sem escolta, e, graças a Deus, ela aceita. Depois de muita relutância, diga-se de passagem. Ela, antes de aceitar meu convite, me pergunta se significaria alguma coisa, caso ela aceitasse sair comigo, sozinha. Eu digo (evasivamente, é óbvio) que significaria que ela queria sair comigo.

A obviedade do que digo vela a percepção clara que eu tinha de que ela não queria, de forma alguma, me dar esperança alguma, em momento algum. Isso era constante, em cada troca de palavras, em cada troca de olhar, ela atuava de forma devidamente evasiva e desencorajante. Mas eu entro no jogo  e entro para ganhar, não desisto em momento algum. O homem feliz é aquele que consegue transformar as ilusões do bel-prazer em realidades. E é isso que eu quero ser: feliz pra caralho!

Marcamos, então, mais tarde nos encontrarmos e conversarmos, sem compromisso e é o que acontece. Nos encontramos no shopping do dia fatídico, da noite da discórdia. Conversamos, damos belas risadas e mostro o que escrevi durante o tempo em que estive isolado, revelo que ela me inspirou a escrever tudo aquilo, revelo que ela é a minha musa, que ela é, realmente, aquela que amo.

Ela me revela, dentre outras coisas, que não quer mais ter nenhum tipo de envolvimento com ninguém, revela que eu não tenho chance alguma com ela, revela, inclusive, que prefere, pior, só gosta de mulheres, o que me fez sentir menos credenciado ainda nessa luta. Coisa que eu já havia desconfiado e, de certo modo, insinuado em momentos pontuais.

Ela pede para que eu não perca tempo, que eu faça um investimento numa amizade com ela ao invés de ficar sofrendo por um amor impossível de se conceber. É claro que não sigo o seu conselho. Queira só o que podes, e serás onipotente. Esse é a frase que resumiria bem seus argumentos. A conversa se segue e eu continuo a deixar bem claro que iremos ficar juntos, que não vai adiantar ela fugir.

No meio disso, ela me fala que tem trauma em relação a bebidas. Que nunca namoraria uma pessoa que bebesse. Posteriormente ela revelaria que tudo se dava por conta de um tio querido seu que havia morrido (na verdade se suicidado) por conta, ou melhor, através de bebidas.

O fato é que o homem havia bebido até morrer (“my hero”) pela pressão recebida, oriunda de sua família, principalmente, após assumir a sua homossexualidade (retiro, em partes, o que disse). Ele não suportou as mordaças colocadas nele pela sociedade, pela sua família, principalmente por sua mãe.

Eu também possuía uma mãe opressora, nem quero imaginar como seria a minha vida se eu fosse gay, usuário ou viciado em drogas. O inferno que seria a minha existência. Por muito menos fui expulso de casa três vezes. Após ela falar a tal história, a olhei nos olhos e disse-lhe que, a partir daquele momento, eu não beberia mais (já que a possibilidade de eu me agarrar com um homem era, obviamente, desnecessária de ser cogitada). Ela me manda fazer isso por mim e não por ela. Eu respondo que faria isso por nós, pelo nosso bem-estar.

Ela abre um sorriso de quem está começando a ser conquistada, mas logo volta a se esquivar de minhas investidas. A noite acaba de uma forma tranqüila e mais tranqüilo eu vou ficando, vou percebendo que, como diriam os latinos de língua espanhola, “si, se puede!”. A esperança começa a vencer o medo dela e a minha tristeza.
 
(continua...)

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